terça-feira, 3 de novembro de 2009

BASTARDOS INGLÓRIOS






O filme abre com um grande plano de uma fazenda no interior da França ocupada pelos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial. Legendas marcam o tempo (1941). Ali chega uma patrulha alemã chefiada pelo oficial da SS Hanz Landa (Christoph Waltz). Ele é conhecido como “O Caçador de Judeus” e, no momento, busca refugiados hebraicos na região rural. Em conversa no interior da residência do dono da fazenda Perrier LaPadite (Denis Menochet), o cínico Coronel da SS sabe que há judeus escondidos sob o piso. E construindo um diálogo sagaz com o interlocutor sobre ratos e esquilos, manda seus homens metralharem o lugar. Feito o massacre, observa o escape de uma garota correndo pelos campos. Ele ainda corre para a porta de revolver em punho. Em alternância de planos vê-se que a menina consegue escapar. Landa a saúda, com ironia. “Bastardos Inglórios”(Inglorious Bastards/EUA,2009) é, principalmente, um filme que usa o cinema como elemento decisivo e referenciado na sua construção. Quentin Tarantino trabalhou em locadora de vídeo e desde que passou a filmar profissionalmente procurou explorar detalhes da cultura popular. O seu cinema não é buscado nas propostas introspectivas ou detalhes cerebrais de temas sociais ou políticos. É, principalmente, um cinema de citação, uma homenagem e, ao mesmo tempo, uma perspectiva critica da própria linhagem do cinema que ele viu e gostou (e gosta). Ou expressa sua maneira própria de afinar as imagens tornando-as presentes, mas, ao mesmo tempo, deslocadas no plano histórico do cinema. Os “bastardos” do novo filme seriam mercenários judeus que se lançam à caça de nazistas retribuindo o que estes fazem com seus irmãos de etnia e crença. Chefiando o grupo que acompanhamos em mais de duas horas e meia de projeção está o conhecido Apache, ou Aldo Rayne (Brad Pitt). Não à toa o apelido. Ao se defrontar com nazistas, ele e seu bando matam e escalpam estes adversários. A medida reflete a ação dos índios norte-americanos de onde surgiu o termo. A barbárie dos anti-heróis do General Custer (1839-1876) é utilizada como método para retaliar o inimigo, incorporando uma missão justiceira.Em episódios, o filme explora um tema que sai da realidade para a ficção sem qualquer reserva. Usando todos os elementos de linguagem com aproveitamento caro aos filmes dos chamados anos de ouro de Hollywood (exceção da explicitude da violência), Tarantino chega a um clímax, muito bem definido, que extrapola qualquer vinculo com uma realidade conhecida. Segundo o seu roteiro, a guerra terminaria antes de maio de 1945. Terminaria num cinema francês, pouco menos de um ano antes, quando Shosanna (Melanie Laurent), a jovem sobrevivente do primeiro massacre apresentado, agora proprietária da sala de projeção herdada de parente, consegue reunir todos os grandes nomes do governo nazista para a estréia de um filme épico alemão que traduz o ufanismo dos membros do chamado III Reich. A idéia é colocar detrás da tela rolos de filme em nitrato, emulsão usada antes do advento do som, que por ser altamente inflamável funcionaria como uma bomba, provocando incêndio em meio à sessão e mandando fechar todas as portas, fato que provocaria a morte dos inimigos (ou, como ela diz em uma das partes de filme incluso num rolo a ser projetado. “o troco dos judeus”). É desta forma, absolutamente divorciada da realidade, que morrem Hitler, Goebbles, Hering, Borman, enfim todos os donos do poder na Alemanha da época.Cinema, para Tarantino, é como se define em física: a ilusão de ótica que faz se perceber imagens em movimento, ou seja, a incapacidade do olho humano em discernir imagens que passem numa velocidade que se estabilizou com o tempo em 24 quadros. Sendo uma ilusão de base, por que não criar o fingimento “fazendo fita” (no dizer antigo) ? E o filme é uma fantasia bem humorada pontilhada de tragédia. Tudo bem cronometrado, bem realizado.Confesso que tive de ver o filme duas vezes para assimilar melhor a narrativa uma vez que na primeira vez estava me rendendo a uma fadiga de noite sem dormir. Mas não foi sacrifício. Creio que é o melhor trabalho do diretor. Para ele também. Vale voltar ao assunto.





Um comentário:

  1. Concordo. Bastardos Inglórios parece-me o melhor filme do Tarantino. Parece que nesse filme ele alcançou a maturidade, aliando o entusiasmo juvenil com um domínio total da linguagem cinematrográfica. Além, é claro, de ter construído personagens marcantes, que vão entrar para a história do cinema, especialmente o caçador de judeus.

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