quarta-feira, 10 de março de 2010

INVICTUS



















O filme de Clint Eastwood, “Invictus” (EUA, 2009) foi vencido no páreo do Oscar. Apostava em Morgan Freeman, o ator principal que já fora premiado como melhor coadjuvante em “Menina de Ouro”, e que também solicitara a Clint para filmar o livro escrito por John Carlin sobre o desempenho político do então presidente Nelson Mandela no campeonato de rúgbi em 1995, em Capetown (África do Sul).
O filme é muito bom. Eastwood, como os grandes cineastas de sua geração (já fez 80 anos) tem o domínio no relato de uma história em linguagem de cinema. E sabe discutir o que tem a contar. No caso em pauta, a base não é só um esporte e uma autoridade que gosta de esporte. É uma observação sobre como se faz política de reconciliação com vias a se estruturar um governo que assumiu um país em péssimas condições financeiras e com certas reservas dos antigos inimigos.
Nelson Mandela passou 30 anos preso pelos ingleses que colonizaram a sua terra, tudo por ser contra o “appartheid”, ou seja, a divisão étnica que alijava o negro do poder. Perdoado depois de reclamos internacionais, foi não só liberto como se tornou candidato e saiu vencedor à presidência da república. Nessa nova condição, ele percebeu que a África do Sul não tinha como alimentar uma revanche ou um “appartheid” reverso. Na qualidade de patrocinador da copa mundial de rúgbi, um esporte inglês na gênese, levou um assistente a comentar que se espantava com um homem que passou tanto tempo preso e que ao sair da cadeia perdoou os seus carcereiros. E mais: como no país não existisse uma tradição no tipo de esporte, investiu na seleção existente formada por atletas brancos (e ingleses) no time. Deu uma aula de convivência pacifica quando, na estréia do campeonato, apertou a mão de um por um dos jogadores chamando-os pelo nome.
O filme centraliza a sua ação nos jogos, mostrando as intercorrências políticas entre a equipe do novo governo e a ação do presidente, daí porque não se torna um enfado a quem não entende as regras desse esporte mas reconhece a política. Particularmente nada sei de rúgbi, mas o que se constituía na emoção era registrar a relação que Eastwood criou entre os dois eixos do “jogo” com ênfase nas artimanhas do presidente Mandela tentar sensibilizar seu povo sofrido com a vingança na alma da necessidade de mostrar que eles vieram para apaziguar. É agressivo ver os atletas se defrontarem com brutalidade para levar uma bola oval ao gol. Mas até aí parece um achado para a temática do filme. O apoio aos brancos após uma vitória negra evidenciava Mandela submetido a demonstrar que “os brutos também amam”. E chegou a mostrar um pouco como os ingleses que ficaram em Capetown viam a ascensão negra ao poder. Os pais do capitão do time (interpretado por Matt Dammon) chegam a dizer a ele que “tome cuidado com o novo regime”. Pensavam em revanchismo. Havia motivo, mas não houve ação neste sentido.
Morgan Freeman assemelha-se fisicamente com o presidente sul-africano e mostra-se extremamente discreto no papel. Podia ganhar o seu Oscar de ator principal, mas ainda perdendo, ganhou elogios internacionais e a consciência de que está apto a fazer filmes importantes com ou sem o seu amigo Clint.
É interessante observar dois fatos: primeiro a oportunidade de o filme ser exibido às vésperas da Copa do Mundo de futebol. Mandela já disse que deseja assistir a partida inaugural. Depois, a posição do roteiro na obra de Eastwood. Continuam presente os personagens que passaram por momentos dramáticos (como o ex-combatente no Vietnam em “Gran Torino”, o ex-boxeur em “Menina de Ouro”, o oficial japonês em “Cartas de Iwo Jima” e assim por diante).
Como o ritmo se faz em função do jogo por uma questão da narrativa é possível que o filme seja visto de forma muito simplista em lugares onde o rúgbi não seja conhecido e Mandela também não tenha a sua biografia ao alcance de espectadores (já houve pelo menos 3 biografias do líder sul-africano em cinema, destacando-se a de Bille August exibida por aqui ano passado). O exagero para atingir o suspense nesse tom revela-se a credibilidade do diretor no que está criando: um filme sobre o jogo político.
“Invictus” deve ser visto. Principalmente pelos que desconhecem essa parte da história e a tendência de “jogador” de um político como Mandela.
Cotação: Muito Bom

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