segunda-feira, 5 de abril de 2010

QUEM É CHICO CARNEIRO – CINEASTA E FOTÓGRAFO




Chico Carneiro é natural de Castanhal (Pará-Brasil), nascido em 1951.

Autodidata e filho de um exibidor cinematográfico (sr. Duca Carneiro), trabalhou na industria de cinema brasileira participando como assistente de câmara e de som nos seguintes filmes de longa-metragem: IRACEMA - UMA TRANSA AMAZÔNICA (Bodanzky-Senna); GITIRANA (Bodanzky-Senna); OS MUCKER (Bodanzky-Gauer); PIXOTE (Hector Babenco); ABC da GREVE (Leon Hirzsman).

Em 1983 migra para Moçambique, trabalhando como director de fotografia e realizador dos filmes documentários da empresa Kanemo, Produção e Comunicação. Destacam-se os filmes: FRONTEIRAS DE SANGUE – doc. de longa-metragem, sobre a gênese da reação armada ao governo da Frelimo (16mm, cor) e KARINGANA WA KARINGANA, filme sobre o poeta JOSÉ CRAVEIRINHA. Direcção de Fotografia e Câmera (16mm. P&b)

De 1993 até hoje é sócio-fundador da PROMARTE, empresa produtora de filmes, onde exerce as funções de Fotógrafo, Operador de câmera e realizador.

Como realizador fez, entre outros, os seguintes filmes: ABC do Ambiente (série para TV 12 docs X 30 mins); Defeso; Saltando à Corda; À Porta da Minha Casa; A água Conhece o Seu Caminho; Reservas – Um Lugar Para Não Viver; Queimadas Descontroladas; O Carvão Nosso de Cada Dia; IRAPISMU – Passos Para o Maneio Florestal Comunitário; In Comunicação; Lorena (premio de melhor vídeo de ficção na Jornada Internacional de Cinema de Salvador – 2005); Muitos Ninguém; Salinas Zacarias
A partir de 2001 voltou a filmar no Brasil, na Amazônia, onde já realizou os seguintes filmes:
Os Promesseiros (2001); Casa do Gilson, Nossa Casa (2003); Seu Didico – Paraense Velho Macho! (2006); Balsa Boieira (2008); Promesseiros de Joelhos (2008 – em edição); Nos Caminhos do Rei Salomão (2009 – em edição).

ENTREVISTA DE CHICO CARNEIRO


P - Como surgiu a idéia da série sobre os barcos da região, dos quais o BALSA BOIEIRA é o segundo filme?

R - A idéia da série surgiu como uma decorrência natural do meu interesse em fazer filmes documentários aqui em minha região natal, mas penso que ela foi alavancada durante as filmagens de “Os Promesseiros”, em 2001. Apesar de já conhecer um pouco dessa realidade dos caminhos das águas (fiz 2 vezes a viagem de navio entre Belém e Manaus, sendo que numa delas foi num navio cargueiro que ia parando em diversos portos da região para deixar e levar produtos e me lembro bem – isso foi no longínquo ano de 75 ou 76 – do impacto que essa viagem me causou por me aproximar de uma realidade que até então eu desconhecia; também sempre curti, quando adolescente, em minhas férias em Marudá, os barcos à vela que faziam a faina pesqueira e da despescagem dos enormes currais que eram quase que uma marca registrada daquela praia...), então, dizia, essa realidade não fazia (não faz) parte do meu cotidiano, enquanto utilizador contumaz dos barcos da região.
Na viagem de 4 dias em canoas a remos pelos rios Apehú (nas proximidades de Castanhal), Inhangapi e Guamá, até Belém, nas filmagens de “Os Promesseiros” cruzávamos com diferentes tipos de barco transportando telhas, tijolos, madeira, gado... e creio que foi aí nessa viagem que a idéia consolidou-se.
Uma vez definida a idéia e estabelecido o fio condutor da série – documentar a vida dos homens que trabalham nos barcos da região – escolhi os temas (transporte de) madeira, gado, pessoas, cerâmica e pescado por me parecer que eles são os produtos de transporte mais comuns, onde a atividade marítima emprega um significativo número de trabalhadores. Também decidi que tinha de fazer a série privilegiando os barcos de madeira, os barcos, digamos, tradicionais da região, os famosos pô-pô-pôs. E embora as balsas que transportam gado não sejam de madeira (seu casco é de ferro – de madeira são apenas os currais e a parte superior da balsa, onde aloja-se a tripulação), a peculiaridade de sua utilização não poderia ficar de fora nessa série.

P – Sabendo que vc filma sem um roteiro ou pesquisa prévias, que dificuldades você encontrou para fazer este filme?

R – Olha, Luzia, pelo pouco tempo de que disponho para filmar (já que os filmes são feitos durante as minhas férias aqui no Pará) eu defini como estética a ser usada na série que os filmes seriam feitos sem pesquisa ou roteiro, ao contrário, queria fazer documentários sem preparação nenhuma, de modo a que eles fossem o mais próximo possível da realidade vivenciada pelos marítimos, sem que a nossa presença (minha e do meu irmão Amilcar, que trabalha comigo) fosse um elemento perturbador ou modificador dessa realidade, do cotidiano deles. Também por esse motivo a câmera é 99% uma câmera na mão, o som direto é 99% das vezes captado com o microfone direcional da câmera. Também raramente repito uma cena: se eu registrei, tudo bem. Se não, tento mostrar a informação de outra forma. Se por um lado essa proposta estética me dá uma liberdade incrível e uma possibilidade de, dependendo da minha atenção, estar sempre em cima do lance do que acontece em qualquer viagem, por outro – e esse eu acho que talvez seja a maior dificuldade encontrada – isso me obriga a uma atenção constante em todos os aspectos do que acontece em uma viagem de modo a que os mais ínfimos detalhes sejam registrados para que depois eu tenha material suficiente para contar os diferentes aspectos do que acontece numa viagem.
Este filme foi montado de maneira cronológica e, ao contrário do filme anterior (SEU DIDICO: PARAENSE VELHO MACHO!) no qual eu fiz a mesma viagem 2 vezes e montei o filme usando momentos das 2 viagens mas construindo o filme como se fosse apenas uma viagem, o BALSA BOIEIRA é rigorosamente o registro de uma viagem de ida e volta da Balsa, saindo de Belém até Belo Monte, na transamazônica, e regressando para a Vila de Pernambuco, no rio Guamá, onde o gado é desembarcado para ser abatido nos frigoríficos de Castanhal.
Não tive exatamente grandes dificuldades pra fazer o filme, até porque o espaço geográfico em que grande parte do filme se passa era justamente a balsa e o seu convés superior (e com espaço bastante amplo), e era fácil para mim locomover-me rapidamente de um lado pra outro da balsa, para frente ou para trás, etc.
Mas a falta de saber o que vai acontecer às vezes gera estresses... lembro-me que quando aportamos em Belo Monte, local onde os bois seriam embarcados na balsa, estávamos à espera de que os caminhões com os bois chegassem e resolvi cruzar o rio, na balsa que faz a travessia regular desse rio, para filmar uns planos do lado oposto da margem. É uma travessia longa, o rio é bastante largo. Mal chegamos no lado oposto e eis que vejo a nossa balsa começando a manobrar para posicionar-se para receber o primeiro caminhão de bois, que já estava chegando. Por sorte havia uma rabêta parada no local que prontamente nos levou de volta, possibilitando registrar o embarque dos primeiros bois na balsa.

P – O que mais te impressionou durante as filmagens?

R - Certamente as crianças que ao longo do Estreito de Breves pegam carona na balsa, seja para percorrer uma longa distancia sem precisar remar, seja para tentar vender algum produto ou pedir um pouco de comida. E, embora eu não tenha presenciado, há o depoimento de um dos tripulantes da balsa que conta que muitas crianças do sexo feminino também aportam na balsa para prostituirem-se, tamanha é a degradação econômica em que sobrevivem.
Essa “pegar carona” acabou gerando uma das sequências mais impactantes do filme, em minha opinião; é simplesmente espetacular a maneira como elas esperam a passagem da balsa e rápida e habilmente jogam uma corda com um pequeno gancho que prende-se nas tábuas do curral da balsa, e manejando o remo com uma habilidade incrível controlam a canoa até amarrarem-na mais firmemente e subirem a bordo.

P – Fale sobre a música do filme.

R – A música do filme foi uma feliz parceria com o Allan Carvalho e o Cincinatto Jr, acrescida da voz maravilhosa da Lívia Rodrigues. Essa parceria iniciou-se com meu filme anterior da série (SEU DIDICO...) e vai prosseguir até último filme da série. Neste exato momento estamos gravando as músicas do terceiro filme (transporte de pessoas), que ficará pronto ainda este ano.

P – Onde o filme foi exibido?

R – Em 2009 o filme já foi exibido no Festival Internacional de Filmes Documentários – Doc Kanema, que realiza-se anualmente, no mês de Setembro,em Maputo, capital de Moçambique. Participou dos festivais Amazônia Doc (1º festival), no qual ganhou (juntamente com o “SEU DIDICO...”) o prêmio de melhor média metragem; e do Festival Internacional de Filme Etnográfico do Rio de Janeiro, em novembro.
Foi lançado em Castanhal na sexta feira passada, dia 26/3/2010, na Casa de Cultura, sob o patrocínio da Fundação Cultural de Castanhal, numa sessão bastante concorrida e com casa cheia.
Também foi exibido para os alunos do IFPA, Instituto Federal do Pará – Campus de Castanhal, numa sessão seguida de debates.
A RedeTV, canal 29, exibiu neste domingo ao meio dia. E continuarei enviando-o para os diversos festivais brasileiros e disponibilizando-o para ser exibido em cine-clubes ou pontos de cultura que constituem, no momento, uma das mais importantes janelas de divulgação dos nossos filmes.


FILMOGRAFIA RESUMIDA DE CHICO CARNEIRO

Filmes em Moçambique

- Saltando à Corda – 1995
- ABC do Ambiente - 1996
- Defeso – 1997
- À Porta da Minha Casa – 1998
- Reservas – Um Lugar Para Não Viver – 1999
- Queimadas Descontroladas – 1999
- O Carvão Nosso de Cada Dia - 1999
- Tartarugas Marinhas na Costa da Inhaca – 1999
- A água Conhece o Seu Caminho – 2000
- IRAPISMU – Passos Para o Maneio Florestal Comunitário – 2002 (Premio FAO, no festival de filmes ambientais da Croácia)
- In Comunicação – 2003
- Muitos Ninguém - 2004
- Lorena – 2005 (Prêmio Melhor Vídeo de Ficção na XXXI Jornada Internacional de Cinema de Salvador)
- Algodão - O Renascer do Ouro Branco - 2006
- Salinas Zacarias – 2009


Filmes no Pará

2001 – Os Promesseiros
2003 – Casa do Gilson, Nossa Casa
2006 – Seu Didico: Paraense Velho Macho!
2009 – Balsa Boieira

Em edição: Nos Caminhos do Rei Salomão

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