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sexta-feira, 15 de outubro de 2010
TROPA DE ELITE 2
Em um país democrático pode-se denunciar falcatruas nas altas esferas administrativas sem medo de um censor qualquer dar tesouradas num filme ou prender quem denuncia. “Tropa de Elite 2” (Brasil, 2010) lembra esta qualidade quando, apesar de nos créditos iniciais dizer que se tratar de uma obra de ficção, acusar autoridades cariocas de crimes como a venda de armas a traficantes nos morros do Rio de Janeiro. No climax, sequencial chega a focalizar uma cena na Assembléia Legislativa onde o principal personagem, Coronel Nascimento (Wagner Moura), acusa alguns deputados como corruptos ligados às quadrilhas. Este enfoque cinematográfico lembra certos filmes norte-americanos como “Corações e Mentes”, ”Sete Dias de Maio” ou, nos dias de hoje, “Wall Street, O Dinheiro Não Dorme”.
O filme de José Padilha examina a verdadeira guerra entre policiais e marginais nas favelas do Rio de Janeiro de um ângulo diferente da primeira exposição (“Tropa de Elite”, 2008, premio maior do Festival de Berlim). Agora é a própria policia que assume a qualidade de vilã. Pouco se vê, por exemplo, do favelado. O focalizado é o agente “durão” e corrupto que mata sem hesitar, negocia com os fora-da-lei, “queima os arquivos humanos” quando sabe que uma ou mais pessoas pode(m) denunciá-lo.
Nascimento, que no primeiro filme tinha a patente de capitão e comandava as investidas nos morros, hoje é coronel e trabalha proximo ao Secretário Estadual de Segurança Pública. A sua posição é vista como decisiva em casos polêmicos, a exemplo, uma rebelião em um presídio onde a guarda invade e mata mesmo que um candidato a cargo eletivo (e professor) esteja negociando antes de deflagar a operação, pedindo paz aos detentos. Sua interferência surtiria efeito, mas os policiais não esperam por isso. Nascimento não dera ordens de ataque, mas a desobediência da tropa tem rescaldos na ação cometida. E continua a ser responsabilizado pelos desmandos que se processam em diversas operações. A ponto de impor autoridade acima de circunstâncias ou de pretensas demonstrações do “ego” de alguns comandados (quando na verdade o autoritarismo encobre o sadismo – e este é a resposta para conluios com o crime mal resolvidos).
Padilha aponta para o hiperrealismo, uma forma de fazer cinema com a liberdade de expressão que se têm hoje. As seqüências de luta armada dentro e fora da penitenciária e das “covas” das gangues lembra “Carandiru” de Hector Babenco. Mas se aquele filme enveredava por retoques alegóricos, até mesmo de alusão religiosa, aqui em “Tropa de Elite 2” não há desvio da problemática focalizada. E as locações nos pontos dos acontecimentos assim como a utilização de tomadas manuais deixam o aspecto de tele reportagem que no caso é muito sugestivo. Nas cenas de ação é como se o espectador estivesse presenciando tomadas ao vivo dos acontecimentos. Ou seja, sinta-se testemunha daqueles fatos, mesmo porque tem conhecimento deles através da midia. Apesar disso não se pode dizer que o filme é apenas um relato seco do que acontece. O realismo corre para os bastidores, e o ritmo de denúncia incorpora o mundo oficial de políticos nominando os tipos de gestores a quem interessa certas parcerias com aquele pelotão de corrupos da milicia formada e vai crescendo até encerrar com uma tomada aérea da Esplanada dos Ministérios em Brasília.
Não sei até que ponto o filme é lançado em época de eleição e no roteiro menciona um mesmo período. Para quem não costuma pensar um pouco em cinema e ver que Padilha está jogando culpa e culpados numa posição genérica que envolve também o tempo. Não há datação explícita, mas os fatos que emergem exploram a atualidade, como a referência à candidatos e à Ficha Limpa.
Tudo pode estar ocorrendo em 2010, como muito antes ou depois, valendo também como cronologia a distância da ação, iniciando em um pretenso “tempo real” para depois retroceder 4 anos e vir caminhando ao encontro da primeira data. A denúncia repercute a ponto de receber aplausos (foi dessa forma a reação dos espectadores na sessão em que estive). Pode valer para os mais apressados como um apelo de oposição (a uma feição genérica de governo). Mas volto ao que escrevi no inicio deste comentário, salientando que a liberdade de expressão é um atestado de um governo democrático. Palmas a isso, como palmas ao trabalho de Padilha, extensivas ao
intérpretes, especialmente Wagner Moura, um dos bons atores da temporada.
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