segunda-feira, 8 de agosto de 2011

SOMBRAS E RUÍDOS



A surpresa do lançamento de uma produção uruguaia instigou o interesse em assistí-la muito mais do que a re-visão do hiper-heroi atual dos norte-americanos em fase de reabilitação da hegemonia mundial – o “Capitão América: O Primeiro Vingador” (2011) criado por Joe Simon e Jack Kirby em 1941e publicado pela Marvel Comics. Assim, fui assistir a “La Casa Muda”(ou “A Casa”/ Uruguai, 2010).

O filme não se furta a diversos “ruídos”. Dirigido e co-escrito por Gustavo Hernández tem o mérito de ter sido realizado inteiramente com câmera digital minúscula e quase todo em plano-sequência, ou seja, (supostamente) filmado de uma só vez sem corte (a rigor há apenas dois blocos inteiros).

O argumento baseia-se em um caso real: numa velha casa de campo foram encontrados numa manhã 3 cadáveres. O imóvel estava desocupado e o proprietário hospedara o casal Wilson (pai) e Laura (filha) para avaliá-lo haja vista que na manhã seguinte os trabalhos de restauração da casa iriam iniciar. O filme parte desse tema e começa com a contratação do casal. Nessa hora vê-se Laura (Florência Colucci) olhando pelas frestas das janelas cerradas e com tapumes. Em seguida, já dentro da casa, com a câmera acompanhando ora distante ora muito perto das personagens, surgem os momentos de tensão que a moça passa a viver. O pai (Gustavo Alonso) logo adormece e ela ouve ruídos que chegam do sobrado. Acorda-o para pesquisar o que está acontecendo. Ele não retorna. Ela o encontra ferido, caindo sem vida. A jovem percorre com um candeeiro, o andar superior. Vêem-se muitos livros em uma estante e algumas fotografias espalhadas. Mas os ruídos prosseguem. O fotografo Pedro Lugue faz um “tour de force” com as limitações artesanais procurando ângulos sugestivos. Há um plano de Laura no canto da tela e uma visão parcial (o que a iluminação consegue detalhar) do interior que espanta pelo fato de ter sido edificado num prosseguimento dos movimentos incessantes de câmera.

Imagens sombrias e ruídos vão alimentando o suspense da platéia. Mas isso em um longa-metragem, mesmo de apenas 78 minutos, inevitavelmente cansa. Há uma espécie de trégua quando Laura recebe a visita de Nestor (Abel Tripaldi), dono do imóvel, que chega de carro. Ela não quer voltar para dentro da casa, de onde havia saído ao ouvir que alguém chegava. Mas ele insiste na presença dela. Os acontecimentos se precipitam: Nestor é assassinado. Em alguns momentos surge em foco, num segundo plano, uma menina. As imagens de outras pessoas no pequeno espaço são rápidas. O objetivo do filme é manter o suspense na unidade de lugar e de elenco (só Laura em foco).

O final divide-se nos créditos que se baseiam nos acontecimentos reais e numa seqüência que surge depois dos últimos nomes de técnicos (do chamado “casting crew”). Não se deve revelar esta tomada. Mas tanto ela como outras posições do enredo são fantasiosas e não se sustentam na pretensão realista do enfoque. Começa com o fato da personagem aterrorizada não sair logo da casa. E as reticências sobre um quarto cheio de fotos, que o final tenta aludir dentro da tragédia acontecida realmente (sem convencer).

Mas não resta duvida de que o esforço dos uruguaios foi interessante. Exemplos próximos como “A Bruxa de Blair” são de outra origem formal. No caso de “A Bruxa...”são pretensos rolos de filmes deixados pelos estudantes perdidos na mata. Que não tomam conta de toda a projeção. Aqui, em “A Casa”, começa pelo uso de uma câmera digital que pode ser até a de um celular. Depois a opção pelo plano-sequencia. Exemplos ilustres no passado, com câmeras de 35mm foram “A Dama do Lago” de Robert Montgomery e “Festim Diabólico”(The Rope)de Alfred Hitchcock. Mesmo assim há recursos técnicos poderosos. O filme uruguaio veste-se de amadorismo. E cativa pelo desafio que foi realizá-lo, mesmo que fantasiasse esse desafio para vender melhor .

Ao que consta já está sendo preparado um remake norte-americano, com Laura Lau e Chris Kentis, protagonistas de "Mar Aberto".

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