quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

CINEBIOGRAFIAS


O que está sendo reclamado no filme “A Dama de Ferro” é a preferência pelo exercício de estilo (cinematográfico) no lugar dos dados biográficos do tipo focalizado. Quem não conhece a atuação de Margaret Thatcher como primeira ministra britância, assistindo o filme continua sem saber. O que se observa é que a diretora Phyllida Lloyd fez o seu trabalho pensando num enfoque personalizado desmontado de uma narrativa linear e cronológica, mas procurando centrar em algumas situações que nortearam a personalidade da Primeira Ministra Inglesa levando-a a ser nominada como “a dama de ferro”. E essa dimensão obrigou a atriz principal, Meryl Streep, a investir-se de elementos caracteristicos da imagem de Thatcher no momento atual, quando ela vive problemas de memória e esquecimento e esta linha norteia toda a ação do filme. As qualidades da atriz, sem dúvida ressaltadas pela semelhança das máscaras que serviram de incentivo ao reconhecimento da cinebiografada, somam-se ao reconhecimento de seu desempenho em “Mamma Mia”, assinado por essa diretora.

Desse modo, é bom considerar que as cinebiografias nem sempre são obrigadas a seguir os passos dos biografados. “J.Edgar” (foto), por exemplo, não é tudo sobre o homem do FBI. Algumas pessoas acharam que o filme dirigido por Clint Eastwood se desviou do foco de vida do administrador da mais poderosa organização policial norte-americana preferindo realçar a vida intima desse personagem. A impressão esbarra justamente no que se critica de outros filmes do gênero, dizendo-se, comumente, que a preocupação dominante é com a pessoa pública sem se ligar para o ser humano que está apoiando essa atuação conhecida de todos. O que se pode dizer de omisso em “J.Edgar” é detalhes de uma carreira polêmica. Mas seria um esforço além de um tempo de produção abordar os tantos anos de Hoover à frente do FBI, seja na sua atuação contra os supostos comunistas (que ele teimava em ver como elementos destruidores da base tradicional norte-americana), seja na sua posição relacionada aos direitos humanos, o que ele condenou ou deixou passar investigando o movimento racista Ku Klux Kan.

O desempenho de Meryl Streep em “A Dama de Ferro” foi recompensado esta semana ao ganhar o BAFTA, maior prêmio do cinema inglês, e isto se soma ao Globo de Ouro de drama que já recebeu. É quase certo que ela vença o seu segundo Oscar como atriz principal (o outro que possui é de coadjuvante por “Kramer VS Kramer”). Nada contra embora eu ache meritório o papel de Glenn Close em “Albert Nobbs”, e, neste caso, ressalto que Glenn nunca foi contemplada com o Oscar, apesar de papéis marcantes como em “Ligações Perigosas”. Vai ser injusto se a atriz entrar para o rol daqueles que só receberam prêmio honorário em fim de carreira.

Sem ser propriamente biográfico, o tipo que o francês Jean Dujardin encarna em “O Artista” é o arquetipo de ídolos do cinema mudo que encerraram carreira com o advento do filme sonoro. Na época, não se imaginava a dublagem e, ídolos como John Gilbert, encerraram carreira apesar de estrelas amigas como Greta Garbo terem procurado ajudá-lo (ele atuou com ela em “Rainha Cristina”, mas o filme não fez sucesso). “O Artista”, ora campeão dos Bafta e vencedor do Globo de Ouro de comédia, concorre a 10 Oscar. É mudo e em preto e branco. Mas é excelente e usa o retrô como um meio de ser original.

Mas em termos de atuação o que me pareceu mais afeito à pessoa real, mais perto de uma biografia sem necessariamente tratar de uma personagem viva, foi Demiàn Bichir em “A Better Life” (EUA, 2011) de Chris Weitz. Interpretando um imigrante mexicano que deseja melhorar a vida da família aceitando dirigir um caminhão de entregas sem ter visto de permanência nos EUA e sem carteira de motorista, o ator apresenta uma máscara admirável. O filme tem semelhança com “Ladrão de Bicicletas” de De Sicca, mas assumindo o aspecto moderno. Espero tratar dele quando chegar aos nossos cinemas. Se chegar.


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