“Ricky”(França, 2010), dirigido por François Ozon
Assistir a filmes inéditos em cópia DVD preenche as
noites para as quais dedico essa atividade que para muitos/as é somente lazer,
mas para mim tem mais um significado que é o “mandar o recado” aos leitores
deste espaço, meus fieis 7, no dizer do saudoso colega Joaquim Antunes. Tenho
sido privilegiada com filmes ainda não exibidos em Belém, de produção francesa
ou, mesmo, de um grupo alternativo de cinema. Isso é importante. Foi o que me
fez relacionar alguns desses programas.
Veja-se “Ricky”(França,
2010). Esse filme surpreende quem pensa se tratar de uma comédia ou de um
melodrama envolvendo criança. Dirigido por François Ozon, prolífico cineasta
que em meio à obra irregular tem alguns títulos excelentes como “Sob a
Areia”(Sous la Sable, 2000), mexe com o chamado “realismo fantástico”
baseando-se em um conto chamado “Moth”, de Rose Tremain, com roteiro do próprio
diretor. O que se pode contar da história é apenas isso: Katie (Alexandra Lamy)
é a mãe solteira de Lisa (Melusine Mayance) quando conhece o imigrante Paco (Sergi
Lopez) e vivendo com ele nasce Ricky (Arthur Peyret). Um dia ela pensa que o
menino está machucado nas costas, culpando o pai que fica com ele quando ela
trabalha. Mas não é bem isso. Logo o menino de meses de nascido revela uma
“anomalia”que espanta os pais e seduz a mídia.
Ao assistir a “Ricky”, vislumbrei
elementos de “O Menino dos Cabelos Verdes”(The Boy with Green Hair/EUA,1948) de
Joseph Losey. Ali o enfoque de uma criança fora dos padrões considerados
normais era sobre seus cabelos, de repente transformando-se em verdes. Devido a
isso o menino, de 12 anos, era marginalizado. Em “Ricky “ é outro detalhe
físico com uma tendência inspiradora de mostrar o processo de liberdade
aspirada pelo ser humano: o menino voa. A diferença é que a trama envereda por
um caminho poético não se contentando com a crítica ao preconceito ou a
estereotipia de padrões. E o mais importante: há aceitação dos próprios
familiares que enxergam mais além do que uma simples deformidade física. Esse
novo sentido do garoto faz com ele aspire muito mais do que a natureza humana
lhe dá. Uma realização simples que emociona. Não sei como foi ignorada por uma
ala da critica internacional. Faltou sensibilidade nas análises correspondendo
ao que desejou o cineasta. E o menininho Arthur é a amostra feliz da criança eutrófica,
ou seja, saudável e bonita.
Outro filme francês de bom nível
chegado em DVD: “A Criança da Meia Noite”(Le Permisson de Minuit/2011) de
Delphine Gleize. Trata de um dermatologista que tem há anos, como paciente, um
menino que possui uma rara doença hereditária implicando a proibição de ele se
submeter aos raios solares. Não é um replay de “O Menino da Bolha de Plástico”,
mas o drama de um jovem que vai ganhando tempo com o uso de máscara para sair
na rua e o encontro com uma garota que lhe vai dar atenção e afeto. A doença é
ainda incurável e o médico é indicado para assumir um posto em outro lugar
aceitando a indicação da OMS. Supondo que será abandonado pelo doutor amigo, o
menor se revolta. Entre a relação médico-paciente e a trajetoria pessoal de
quem é confiavel nessa relação, emitem-se idéias ao público mostrando a
responsabilidade na carreira profissional em dois ângulos: a coletiva e a
pessoal.
Bons desempenhos e narrativa fluente
pedem a participação do público. Não é só uma história de “plantão médico”, mas
um drama que se lança em vários fatores como a amizade, a socialização, o
primeiro romance, o preconceito, a dor. Vale a pena conhecer.
“Cinema Verite”(EUA,2010)
surpreende na abordagem de uma espécie de Big Brother nos anos 60. Um cineasta
se propõe a fazer um filme realista sobre uma família norte-americana.
Seleciona esta família por achar elementos dignos do tema e passa a filmar os
elementos em diversos ramos de atividades. Mas a captação do “reality” acaba
surpreendendo as falhas da harmonia conjugal. E o cineasta acha que isso vai
enriquecer o projeto com o sensacionalismo que o acompanha. A perda do foco
temático e a inversão do que espera extrair para evidenciar o “modelo
norte-americano de familia” revelam-se devastadores nessa ambiência. Trata-se
de um caso ocorrido em um programa de reality show, contrapondo-se, no final,
os personagens reais e os protagonistas do filme. Bons trabalhos de todo o
elenco (especialmente de Diane Lane e Tim Robbins) e direção segura de Shary
Springer Berman e Robert Pucini.
Oi, Luzia!
ResponderExcluirA saída inteligente em Belém são mesmo os DVDs, embora eu ainda resista a esse tipo de mídia. De pouco adiantou ter vindo Cinepolis e Moviecom para cá; só blockbusters e assim a gente vai perdendo os bons filmes. E ainda nos empurram filmes dublados, dando-nos atestado de isolamento e ignorancia por sermos nortistas. Lamentável!
Saudações,
R.Secco