Maria do Rosário Caetano (SP)
Gostei muito do filme
"Gonzagão de Pai Para Filho", de Breno Silveira. Mas, para meu
espanto, fora Susana Schild (O Globo), Neusa Barbosa (site Cineweb: que, me
parece, gostou, mas ainda não li a crítica dela!!!-- NEUSINHA ME INFORMA QUE A
CRITICA DO CINEWEB É DE AUTORIA DE LUIZ VITA!!! e que ela gostou do filme),
Isabela Boscov (na Veja: gostou com algumas restrições), só vejo críticas
pesadas ao filme. Inácio Araujo (na Folha) deu regular. Conversamos sobre a
crítica dele, num dos corredores da Mostra SP, com breve (e educada) troca de
ideias. Rubens Ewald, na Tribuna (de Santos) não gostou. Os críticos mais
jovens, pelo que me contam (e por conversas que mantive com alguns deles) DETESTARAM
o filme. Não tive tempo de pedir cópias destas críticas (a maioria na
internet). Nem tive acesso aos jornais do Nordeste (em especial de Pernambuco),
nem do Centro-Oeste, nem do Sul, nem da Amazônia.
Hoje, li uma crítica
positiva (e muito bem argumentada) de José Geraldo Couto, no blog
dele/Instituto Moreira Salles. A primeira crítica positiva assinada por um
crítico do sexo masculino!!!!!. Afinal, Susana, Neusinha, Boscov e eu somos
mulheres. Será que o filme de Breno sensibiliza mais às mulheres??? Fica a
pergunta.
Tenho fama de
"madre Teresa de Calcutá, ou Irmã Dulce, do cinema brasileiro". Ou
seja, defensora juramentada do cinema pátrio (e do cinema latino-americano).
Que seja. Gostei muito da pegada documental de "2FF". Mas não gostei
de jeito nenhum de "Era Uma Vez", segundo longa de Breno. Achei os
diálogos terríveis, inverossímeis... enfim, custei esperar o final da exibição.
Não me entusiasmei com "À Beira do Caminho". Só tive prazer em ver o
show de interpretação de João "eye ligth" Miguel e do moleque
Vinícius Nascimento...
Fui ver
"Gonzagão, o Filme" com imensa expectiva (Gonzagão é um dos raros
"reacionários" que sempre amei!). Quando a sessão começou com aquele
prólogo de imagens fragmentadas e violinos (ou rabecas??) chorosos e chantagistas,
eu gelei."Dio mio" -- pensei -- "Breno desaprendeu. Foi
contaminado pelo melô de Era Uma Vez e À Beira do Caminho. Mais um caso perdido
no cinema brasileiro".
Foi só o prólogo
acabar e lá estava o Breno Silveira de "2FF", com seus atores
não-televisivos, sua pegada documental, sua capacidade de fazer bons filmes
populares e de inserir seus personagens em seu tempo histórico, suas pitadas
sociais, sua elegância narrativa, etc, etc. Saí satisfeita do cinema. Breno
voltava à boa forma!!!.
Aí comecei a ler as
críticas. E a conversar com colegas da Abraccine. Inclusive com os
pernambucanos. DE FORMA ainda apressada, pois ainda não li as críticas
(nordestinas, em especial, mas vou ler!!), tiro algumas conclusões (APRESSADAS,
repito!):
1. Breno Silveira
paga caro por ter a Globo Filmes como parceira neste projeto. E por integrar
produtora badaladíssima como a Conspiração.
2. Desperta certo
ressentimento no jovem cinema (e na crítica) pernambucano(s) por ter feito um
filme de temática pernambucana (Gonzagão nasceu em Exu e foi eleito o
personagem do século XX pelos pernambucanos), com grana do Governo (e empresas)
do estado (quanto há de $ pernambucano no filme?). Ele é CARIOCA!!!!, apenas
neto de avô pernambucano!!!
3. Breno trabalha no
campo do melodrama, gênero desprezado (inclusive por mim, amante do
distanciamento crítico brechtiano) e não nega que quer fazer cinema popular de
qualidade. Ou seja, filmes que dialoguem com o grande público. Nada mais
natural num cineasta (e FOTÓGRAFO, que, inclusive, fotografou documentários de
Eduardo Coutinho!) que estreou com um filme que fez 5,4 milhõesssss de
espectadores: "2FF").
4. Breno Silveira fez
um filme APELATIVO, DESPREZIVEL???????? Não. "Gonzaga de Pai pra
Filho" é um filme digno, honesto, que recria uma história arrebatadora: um
filho não-biológico, que cresce no morro/favela, longe do pai famoso (ligado
aos militares e à Arena: no filme, um jovem cearense pede ao jovem Gonzaga, que
passara quase dez anos servindo ao Exército, que cante coisas do Norte, e não
fados e assemelhados. Sabem quem seria este jovem, anos mais tarde? ARMANDO
FALCÃO, o ministro da CENSURA militar, aquele que nada TINHA A DECLARAR!!). O
filme trabalha com vigor e concisão o difícil relacionamento entre pai
conservador e filho rebelde, sertão X favela, amor filial e bastardia, etc,
etc.
5- Me dizem que o
filme desconhece elipses, que é longo demais, que perde o ritmo.... O filme
dura, creio, 2h05. Para mim, ele é vertiginoso. Não senti um segundo sequer de
tédio. Como sou "gonzagueira" desde a infância, sei muito sobre ele.
Para completar, li os livros de Dominique Drefus e de Regina Echeverria. E tive
o prazer de ver muitos shows de Gonzaga e de entrevistá-lo para jornais
brasilienses (como já disse, era o único reacionário que me mobilizava como
ouvinte, espectadora e jornalista! Nunca entrevistei Nelson Rodrigues!!!!). Se
o filme não tivesse ritmo, eu que conheço bem o assunto, me desinteressaria.
Mas fiquei grudada na tela. Quando o filme acabou, eu pensei que estava ainda
na segunda de três partes, que a narrativa chegaria à última paixão de Gonzaga
(uma amante que o acompanhou na fase das doenças), ao enterro ÉPICO pelosss
Nordestesss, a Gonzaguinha na beira do túmulo com o gibão cangaceiro do pai na
mão. E à morte do próprio Gonzaguinha, menos de dois anos depois do pai, etc,
etc.
6. HUMOR -- A parte
da crítica que vem se entediando com o filme não deu a mínima para o fino humor
da narrativa. Nem para o show de 3 ou 4 atores (dois estão iluminados: Claudio
Jaborandi e João Miguel). A cena do recrutamento de Meio Quilo (o sapateiro) e
Salário Mínimo (o anão), seguida do ensaio NUDISTA no riacho é deliciosa!! E a
sequência do duelo de Mestre Januário e sua sanfoninha de 8 baixos X Gonzaga
com sua sanfana prateada??!!!! É cinema da melhor qualidade, construído com
imagens, não com diálogos (sub)literários. É filme de fotógrafo-cineasta!!!!
7. ESTERILIDADE -
Parentes (e amigos) de Gonzagão não gostam de que se diga que ele era estéril
(vide depoimento de Lelete, a viúva de Gonzaguinha à Folha de SP, no dia da
estreia do filme!). Fui ver o filme sabendo que Gonzaguinha não era filho
biológico de Gonzaga. Só que Breno e seus roteiristas me pregaram uma peça.
Quando vi a rabugenta Helena barriguda, quase caí da cadeira. Mas quem
engravidou esta mulher, pensei? Em segundos, Breno desconstruia a cena. Louca
para engravidar, a madrasta, que detestava o bastardo Gonzaguinha, arrumou uma
barriga falsa (Breno diz que isto é fato comprovado). Outro bom momento do
filme.
8 - RELAÇÃO COM OS
MILITARES -- Rubens Ewald Filho, de quem sou leitora fiel (em A Tribuna, de
Santos) acha que o filme tem vergonha de nos emocionar. Depois de ver tanto
sofrimento do filho em busca do amor do pai, ele acha que o público merecia um
grande encontro dos dois artistas, felizes e cantando juntos. E mais: que a
ligação de Gonzagão com a Ditadura Militar não é explorada. Na minha opinião,
é: 1. na cena em que o jovem Gonzaguinha deixa o apto da Ilha do Governador
(recheado de posters esquerdistas) depois de briga violenta com o pai, que o
acusa de defender ideias comunistas. 2. na cena em que Gonzaga canta para
militares de altas patentes, com suas muitas estrelas e dragonas.
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