Ernani Chaves
O filme é seco, marcado pela
figura imponente e exemplar composta por Juliette Binoche. O hospício de
mulheres em meio à paisagem bela e áspera do interior da França é tão
protagonista quanto a desolada ex-amante de Rodin. Chamo atenção para duas
cenas.
A primeira, quando “Camille”
assiste ao ensaio do “Don Juan”, de Moliére, encenada por loucos do hospício.
Trata-se, em princípio, de uma comédia e todos acabam rindo, inclusive Camille,
da forma engraçada com que “Don Juan” tenta convencer uma mulher de que tem
boas intenções para com ela. A cena é repetida várias vezes, porque aquele que
representa “Don Juan” sempre erra o texto. E a cada repetição da cena, o que
era engraçado para Camille começa a se parecer demais com sua trágica história
de amor, como se “Don Juan” fosse uma espécie de prefiguração de Rodin e ela vê
no palco a sua própria história. A passagem da expressão facial de Juliette
Binoche a cada vez que a identificação de Camille com a cena se torna mais
forte é dolorosamente precisa. Passagem do riso ao choro compulsivo, da comédia
à tragédia, ambas facetas do humano, demasiado humano.
A segunda, se trata de um breve
diálogo entre o irmão de Camille, o poeta Paul Claudel (que logo depois da
visita à irmã relatada no filme, vem para o Brasil como diplomata) e um padre,
pouco antes do encontro com Camille. Paul, que havia se convertido em ardoroso
católico, assinala a proximidade entre a arte e a loucura. Uma proximidade que
a literatura, a partir do século XIX, tematizou bastante.
Como se a arte fosse o último reduto da possibilidade de retomarmos uma
experiência com a loucura que fosse uma experiência com a verdade e não com uma
patologia. A fé de Paul não é suficiente para que ele voltasse atrás e atendesse
ao pedido de Camille e do próprio psiquiatra que tratava dela, para que ela
voltasse para casa. Ele prefere abandoná-la no hospício, condenando-a, de algum
modo, à morte. Camille passou seus últimos trinta anos de vida internada, em
geral amarrada e sedada.
Camille Claudel morreu aos 79
anos e deixou uma série de esculturas absolutamente maravilhosas. Dentre elas,
gostaria de lembrar “A idade madura”, exposta no Museu d’Orsay, em Paris,
criada logo depois de sua separação de Rodin.
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