Julianne Moore e Denis Haysbert em "Longe do Paraíso"
Considerado
um cineasta com carreira eclética no cinema atual, o norte-americano Todd
Haynes, explora, em 2002, um tema e modo de ver a sociedade dos anos cinquenta
de seu país, utilizando-se, em “Longe do Paraíso”(Far from Heaven, EUA, 2002)
seu quarto longa metragem, a linha narrativa central tão cara na filmografia do
veterano diretor alemão Douglas Sirk. Houve, inclusive, alguns críticos que
descreveram a sensação de que este filme seria uma paráfrase inspirada em “All
That Heaven Allows”(Tudo Que o Céu Permite, EUA, 1955) em que uma viúva, já madura, protagonizada
por Jane Wyman, é quase expulsa da comunidade em que vive, por envolver-se com
seu jardineiro (Rock Hudson). Posição social e geracional são os motes da
discriminação contra ela.
Há, contudo, outras ingerências no
filme de Todd Haynes tomando a situação das relações de
gênero com ênfase na posição submissa de uma mulher de classe média na sociedade
norte-americana nos anos cinquenta e pontuando dois eixos, um deles pouco usual
no cinema de Sirk. Primeiramente, a homossexualidade de Frank Whitaker (Denis Quaid)
casado com Cathy (Julianne Moore), pai de um casal de filhos e avesso a que a sua
situação homoafetiva venha à tona, ao ser flagrado pela esposa e amedrontando-se
com a condenação social e aos seus negócios. O segundo elemento, o preconceito
racial, envolvendo a esposa de Frank, ao se aproximar de seu jardineiro negro, Raymond Deagan, (Dennis Haysbert) se torna suspeita
de manter relações afetivas com ele. Mas não é só isso, pelos boatos sobre o
envolvimento de Cathy com a associação de proteção aos negros e, ao dimensionar
a discriminação racial na escola entre seus filhos, estes são penalizados. Neste
caso, a similaridade recai no filme “Imitação da Vida”( EUA, 1959), de Sirk, dentro
do tema preconceito racial.
Nas
primeiras sequências, a formatação do eixo central – familia norteamericana
classe média, heterossexual – é explorada pelas midias da época – revistas de
leitura doméstica – evidenciando-se os padrões desse modelo, com referenciais
de representação social em que todas as atividades comunitárias e privadas são
de responsabilidade das mulheres, que demonstram a perfeição aspirada no
relacionamento intrafamiliar. São as mulheres – apresentadas como figuras
frívolas – que conduzem a organização da casa e das entidades sociais. O
“aplomb” (como se dizia antes, para referir o autodomínio pessoal) deveria ser
uma atitude feminina, enquanto a tomada de decisões racionais dependia do
caráter masculino. Dessa forma é conduzido o casal Whitaker visto no
comando do símbolo da “familia perfeita”.
Mas
à medida que os sinais dessa referência são postos a prova, alguns “remédios”
são usados internamente. No caso do marido, a esposa leva-o a um psiquiatra que
conduz a “cura gay” preocupada em manter o status quo daquele padrão que a faz
“feliz”, como define sua vida para as amigas. O terapeuta informa ao seu
“paciente” – inclinado a ser o exemplo do hetero – quais medidas a serem
adotadas por sua ciência para o retorno ao controle da sexualidade. E as
sessões são inciadas. Quanto à esposa, despojada há tempo de uma sintonia com a
afetividade (cf. uma conversa em que suas amigas declaram quantas vezes/semana
mantêm relações sexuais com seus maridos) e/ou um retorno ao seu modo de ser
amável, sente-se atraída por quem lhe dedica algumas horas de seu tempo – o
jardineiro Raymond. O envolvimento com a situação racial em sua pequena comunidade de Connecticut (EUA)
não se refere apenas a esse episódio, mas sendo contrária à discriminação
desencadeada entre as pessoas do lugar. Fofocas e a própria reação do marido
contra ela poderiam ser meios de afastar-se da trama. Mas não é isso o que
ocorre.
Não se pense que há um fecho comumente
usado pelo cinema norte-americano. O público irá desenvolver suas próprias
conclusões no final do filme.
Quanto à narrativa, há realmente uma
grande afinidade entre “Longe do Paraíso” e o cinema de Sirk. Veja-se, por
exemplo, a fotografia (de Edward Lachman), com reprodução exemplar do tom
pastel tão presente em “Tudo Que o Céu Permite”. Aliás, a voz corrente da
crítica mundial aos trabalhos desse diretor é de que esse recurso sintoniza com
o que ele pretendia evidenciar da hipocrisia da sociedade norte-americana, numa
metáfora que escamoteia as tensões internas intra-familia e o que deve ser
visto socialmente.
Um filme que deixa pensar em
tantas questões debatidas inclusive na sociedade brasileira hoje.
Grupo de mulheres classe média da sociedade de Connectcut dos anos cinquenta.
Luzia como eu comentei no seu outro post, a questão da descoberta da homossexuliadade do marido de cathy, é apenas a ponta do iceberg para que se desecandeia todos os precocncietos que existiam na sociedade americana nos anos 50, o precocneito sexual, racial de classes.
ResponderExcluiruma coisa interessante, de prestar atencão o estado de Connectiut onde se passa a ação do filme hoje em dia é um dos estados americanos que permitem o casamento entre pessoas do mesmo sexo.