Harrison Ford e Asa Butterfield em "Ender's Game".
O conto de Orson Scott Card que originou “Ender’s Game – O
Jogo do Exterminador”(Ender’s game, EUA, 2013) pode ter um objetivo antibélico,
retratando ETs invasores como formigas e os militares terrestres como
“dedetizantes”, atacando o ninho onde deve estar a “rainha”, antes que aconteça
um replay de invasão (a primeira tem caráter dúbio e na historia a ser contada
já se passaram 50 anos do fato). Também evidencia que novos valores guerreiros
devem ser treinados sem explicitar que os velhos comandantes preferem se
esconder de culpa por precipitação do ato bélico.
Todas as tramas que o filme aborda são interessantes e
poderiam ganhar espaço acima de um “décor” trabalhado como um videogame e, com
isso, ser agradável a um publico infanto-juvenil. O diretor Gavin Hood não
trabalha uma profundidade no aspecto moral, moldando apenas o rosto de um
garoto que de ingênuo filho de classe média transforma-se em um autêntico
estrategista.
O filme ainda projeta similaridade com um recorte
singular evidenciado em “Nascido Para Matar”(de Stanley Kubrick) ao focalizar
um oficial que “de cara” cisma com o personagem mirim e o trata com violência a
ponto de merecer uma resposta dramática. Curioso é que esse antagonista é
fisicamente menor do que o maltratado. Na verdade, há certa expectativa de
todos os grupos formados no período de aprendizado dos “games” em relação ao
nível de intuição desenvolvida por Ender e essa figura não poderia estar de
fora, haja vista que o garoto é mandado para a turma dele, portanto,
confrontando poderes.
“Ender’s Game”(o nome deriva do personagem principal) pode
passar como um “game” realmente. Os aficionados a esse tipo de jogo eletrônico
devem se achar na mesa de controle, apenas alimentando uma premissa em que o
militarismo é visto como um mal a ser curado pela inteligência. Por isso,
aliás, que o filme abre com uma frase do autor do conto que diz aproximadamente
“quando o inimigo demonstra que pensa ele passa a ser amado por quem pensa”.
O jovem ator Asa Butterfield, revelação de desempenho no
clássico “A Invenção de Hugo Cabret” (2011) e já demonstrando talento em “O
Menino do Pijama Listrado” (2008), é realmente um dos poucos elementos que
seguram o filme. Ele está sendo elogiado pela critica norte-americana a ponto
de premio. Que receba bons papéis doravante são meus votos, atravessando a
difícil fase de adolescente para adulto.
Como ficção cientifica “Ender’s Game” tem o aparato cênico
das produções mais caras do gênero, mas bem longe de uma historia imaginosa
como criava um Richard Matheson (autor de “O Incrível Homem que Encolheu”, “A
Lenda’ e muitos episódios da série de TV “Além da Imaginação”). Isso transforma
o resultado em um programa para uma faixa etária. Certamente foi o motivo de
ter fracassado como blockbuster. No Brasil, se tentou forçar a bilheteria com o
subtítulo “O Jogo do Exterminador”. E até que procede. Exterminar os inimigos
com um só disparo de um engenho que atua como um câncer, reproduzindo moléculas
a partir de um tiro, é tratado como uma partida em que o mais esperto tende a ganhar.
Mas é justamente no aproveitamento desse jogo que o filme perde força. No final
até que tenta se redimir quando Ender se defronta como Formic, ou a rainha
formiga, e pede perdão pelo massacre de seus súditos (ou “operárias”). Mas a
atitude súbita não convence os mais céticos. Ainda mais quando o pequeno
personagem abdica da oportunidade de ser famoso. Se for avaliado desde o
começo, vê-se que são elementos de um caráter que tudo faz para entender a
motivação daquele jogo supostamente virtual, mas, na verdade, superando esse
nivel e avançando para a realidade concreta, que é a objetivação dos seus
mestres que o observam por detrás dos vitrais. O impacto do face-to-face com o
inimigo dá a Ender o senso intuitivo de reconhecer que poderia ainda entender-se
com este (no caso, Formic), sem dizimar seu contingente. Nesta sequencia,
aliás, reconheci a situação de Klatoo (“O Dia em que a Terra Parou, 1951)
quando os militares americanos não esperaram o diálogo que o extraterreste
sugerira e atiraram nele.
O que é possível tirar de proveito da realização é o que
se esboça. Pelo menos por ai o programa se justifica para quem tem a “mania” de
pensar assistindo a filme comercial.
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