Matthew McConaughey num grande desempenho. Provável Oscar
A primeira sequência de filme “Clube de Compras Dallas”
(Dallas Buyers Club, EUA, 2013 )
mostra, nos bastidores da arena onde cowboys desafiam o tempo de permanência
montados em touros ou cavalos selvagens, o eletricista heterossexual Ron
Woodroof (Matthew McConaughey) fazendo sexo com alguém. No fim do filme
volta-se à arena e ao personagem, mas ele aparece montado num dos touros em
competição e sai acenando orgulhoso o seu equilíbrio, congelando-se o plano.
Esta elipse, comparando prefácio e epílogo do filme dirigido
pelo canadense Jean-Marc Vallée, evidencia o drama do personagem que se torna
vitima da AIDS, adquirindo o vírus HIV de suas porfias sexuais e uso de drogas,
sendo diagnosticado em 1985 e cujo período de sobrevida de apenas 30 dias.
Woodroof se nega a aceitar esse prognóstico conseguindo sobreviver na época em
que a doença matava incontinente. Primeiro apela para a aquisição camuflada da
medicação em uso nos hospitais, o AZT, depois, como seu fornecedor se nega a vender-lhe
a dose necessária, indica-lhe, entretanto, um médico e pesquisador mexicano que
poderia ajudá-lo. Até então em fase experimental, sem liberação para o consumo
pela FDA dos EUA, Ron não só adquire para si o medicamento, mas para outros com
o mesmo problema, criando empresa com taxa para associados ao custo de 400
dólares mensais. Embora ainda homofóbico, sua maior aproximação passa a ser com
Rayon (Jared Leto), seu parceiro no hospital.
O filme é exclusivamente do ator principal. Poucas vezes se
vê no cinema um empenho tão grande por um papel. Matthew emagreceu cerca de 20
quilos, reforçou a maquilagem para se mostrar mais debilitado, usou uma
expressão corporal incomum, expandindo suas atitudes e ganhou presença em quase
todos os planos. É um trabalho exaustivo que eleva o filme ultrapassando algum
percalço do roteiro, um pouco fragmentado, mesmo seguindo linearmente a
historia do homem que se ufana de “machão”, repelindo o diagnostico de uma
doença ligada aos homossexuais, àquela altura marcada pelo preconceito sobre a
sexualidade na “terra dos hetero”, e de sua luta pela cura contra todas as
estimativas médicas de seu tempo.
Vallée que dirigiu o muito bom “C.R.A.Z.Y.”(2005) também
consegue um desempenho de coadjuvante excelente em Jared Leto como o travesti
Rayon. Basta compara com o Nemo de “Sr. Ninguém”, o filme do belga Jaco Von
Dormael. Os dois atores, Leto e Matthew, disputam o Oscar no próximo domingo,
com o primeiro sendo o favorito, mas os dois já premiados no recente “Globo de
Ouro”.
“Clube de Compras Dallas” é, sobretudo, a luta pela vida.
Por mais que o tipo do
cowboy se mostre uma pessoa sofrida, e isso se vê quando procura tratamento
alternativo para o seu mal e encontra um médico exilado do meio profissional,
um pesquisador voluntário que lhe oferece a chance de usar não só o AZT, mas
uma combinação com proteína capaz de estancar o efeito do vírus sobre as
defesas de seu organismo deixa o tipo com a chance de se vangloriar da passagem
do tempo marcado por quem primeiro o atendeu em um hospital.
Ron doma a doença como doma o animal que monta. E não pára
seus hábitos durante o tratamento que faz, continuando a usar cocaína e a fazer
sexo sem precaução. E vai além da ousadia com o seu próprio corpo: ganha
dinheiro contrabandeando as drogas anti-HIV para pessoas que necessitam. Forma
um verdadeiro laboratório paralelo e isso chama a atenção das autoridades
levando o caso a julgamento. Com todos os empecilhos, o doente sobrevive 7
anos, além da estimativa dada pelos clínicos, ganhando a confiança de uma
médica que se admira da coragem dele.
O filme se baseia em fatos reais e o roteiro de Craig Borten
e Melisa Wallack veio de uma conversa com o próprio Ron Woodroof. É desses
trabalhos que nos créditos afirmam se tratar de fatos reais. No caso, uma
realidade surpreendente que acaba ganhando feitio de homenagem mesmo em se
tratando de um contraventor.
Mas não é só isso. O caso de Ron é mostra, pelos roteiristas,
as engrenagens da agencia farmacêutica e as barganhas que os laboratórios
realizam para “vender” seus produtos mesmo a custa de vidas humanas, o que já
foi denunciado, inclusive, por Fernando Meirelles em “O Jardineiro Fiel (2005)
envolvendo governos e multinacionais nas tramas do setor financeiro.
O lançamento do filme em Belém está em poucas sessões, numa
sala distante do centro da cidade.
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