O presidente João Goulart em um de seus pronunciamentos
Muito oportuno o titulo do documentário de Camilo Tavares
sobre o golpe militar de 1964 e que hoje será exibido no cinema Olympia como
parte da programação: “1964: Lembrar Para Não Esquecer”.
O filme repassa a gênese do golpe (crise provocada pela
renúncia do presidente Jânio Quadros em 1961) e focaliza primordialmente o
papel dos EUA em todo o processo. Centra, principalmente, na ação do embaixador
norte-americano na época, Lincoln Gordon, passando pelas inúmeras manifestações
do então presidente John Kennedy sobre a situação do Brasil e transferindo-se
para o sucessor dele, Lyndon Johnson após o assassinato do primeiro. Prossegue
até 1969, com o sequestro do embaixador Charles Burke Elbrick, por grupos
armados, que pediam a sua troca pela libertação de 15 presos políticos (entre
os quais estava o jornalista Flávio Tavares, pai do cineasta), banidos para a
cidade do México. É nessa cidade que em 1971 nasce o cineasta cuja primeira
idéia do filme seria abordar a vida do pai.
Imagens mostram navios dos EUA nas proximidades de águas
brasileiras prontos para entrar em ação se os militares do país não depusessem
Goulart. Havia até mesmo um porta-aviões esperando ordens para sobrevoar pontos
estratégicos.
A CIA e a casa Branca teriam tido um papel de destaque na
estrutura golpista, com o Pentagono preocupado com a transformação do Brasil
numa “nova Cuba”.
A operação chamada “Brother Sam” é esmiuçada com documentos e
entrevistas com pesquisadores brasileiros e norte-americanos, num prodigioso
levantamento de dados, com as gravações sonoras liberadas em 1969 pela Biblioteca
Presidencial Lyndon Baines Johnson, audios que foram difundidos em 2004
pela organização governamental “The National Security Arquive”. Há ainda
materiais encontrados em outras bibliotecas onde a memória de John Kennedy
(1961-1963) e de Lyndon Johnson (1963-1969) são preservadas, além de imagens de
emissoras de tevê dos EUA.
As intervenções dos presidentes norte-americanos ao processo
se fazem atreladas às suas vozes nas assertivas com Lincoln Gordon e outros
brasileiros que estiveram no conluio militar.
A costura do material que o cineasta encontrou ganha um
ritmo de filme dinâmico e o espectador comum, mesmo o que abomina o genero
“documentário” fica empolgado com o que vê. Devido a opção por ferramentas de
ficção usando o audio e as imagens dos presidentes norte-americanos ao lado de
figuras da política brasileira, material manipulado digitalmente conforme
estivessem negociando a intervenção e o golpe no Brasil, alguns críticos viram
nisso certo desconforto quando, ao meu ver, se torna uma maneira de ostentar as
conversasões permeadas de informes dos inúmeros “espias” daquele país que
chegavam com a função de repassar informações. Se o olhar de Kennedy se desloca
para uma outra sequencia em que Jango está em visita e cumprimentando o
presidente chinês ou russo, trata-se de uma maneira objetiva de mostrar que
essas imagens reais causam desconforto aos grandes parceiros do golpe. E isso é
conseguido com a comprovação dos documentos em fac-simile que são expostos no
filme. Também a presença dos historiadores norte-americanos narrando os fatos
em processo vem comprovar que essa versão do golpe era do pleno conhecimento da
“inteligentzia” daquele país. Os jornalistas e pesquisadores brasileiros –
Marcos Sá Corrêa e Carlos Fico, este professor da UFRJ – não somente dão suas
lembranças pessoais, mas confirmam as situações políticas que ocorreram nesses
anos de prisões clandestinas, tortura, morte e desaparecimento de cidadãos e
cidadãs que se mostravam contrárias às arbitrareidades.
A narrativa estanca no governo Medici. O fim do período
citado não se esmiúça. Mas o eixo final é justamente o sequestro e a exposição
dos 15 presos políticos que foram trocados pelo embaixador Elbrick e banidos
para o México. O documentário “Jango” de Silvio Tendler (já exibido aqui) diz
mais desse governo. Entretanto, ninguém antes tinha detalhado a participação
norte-americana na invasão de nossa vida publica. Nesse ponto, o filme de
Tavares chega a ser enfático e penetrante.
O programa que está no Cine Olympia vai seguir até domingo,
dia 6, com filmes e depoimentos de pessoas que viveram a época. Um momento histórico
para um episódio triste da vida do país. Mas que mostra a sua cara a medida que
essas verdades se tornam públicas.
Luzia, bem que esse filme poderia ficar mais tempo em cartaz no Olympia, tai a sugestão
ResponderExcluirMuito bom o blog, adorei. Muito interessante!!
ResponderExcluirSra. Luzia,
ResponderExcluirCheguei, por acaso, ao seu blogue, quando procurava informações sobre o filme "Recordações", com Susan Hayward, uma das minhas queridas atrizes. Ao ver que a sra é de Belém, me lembrei de Acyr Castro, escritor e também crítico de cinema. Chegamos a nos corresponder por algum tempo, conheci-o quando estive nessa cidade em 1999, mas, por esses mistérios da vida, perdemos o contato. A sra sabe informar se ele está vivo? Espero que sim e com saúde. Antecipando agradecimentos, envio-lhe o meu abraço. Francisco Sobreira