Cena de "Limite", de Mário Peixoto.
A restauração de “Limite” (1930), a obra (única) de Mário
Peixoto, foi submetida a uma série de obstáculos a partir do abandono a que o
filme foi legado depois de seu lançamento (assim mesmo restrito). Mas conseguiu
ser recuperado nos anos 1960 acompanhando o processo de restauração através da
produtora e funcionária do INCE, Myrce Gomes Rocha (a segunda esposa do
professor Plinio Sussekind Rocha. Myrce esteve em Belém produzindo o
documentário “Waldemar Henrique Canta Belém”, de Miguel Faria Jr. em 1978). Recentemente, o filme foi restaurado pela Cinemateca
Brasileira e a nova versão foi apresentada em novembro de 2011 no Auditório
Ibirapuera em São Paulo, na ocasião com uma trilha sonora,
composta pelo norueguês Bugge Wesseltoft. Esta cópia deve ser apresentada hoje, 14/10, no cinema Olympia
compondo o programa “Cinema e Música” visto ser acompanhado de uma trilha
musical tocada ao piano pelo Professor e Superintendente da Fundação Carlos
Gomes, Paulo José Campos de Melo.
“Limite” é um filme lendário. O autor (e cabe o titulo, pois
tudo é dele) tinha 22 anos e depois de escrever a historia pensou em contratar
o cineasta Humberto Mauro para a adaptação, a quem chegou a procurar. O diretor
de “O Canto da Saudade” disse que o melhor seria o próprio Mario dirigir. E ele
seguiu o conselho. Mesmo porque ninguém teria a coragem de expor uma linguagem
surrealista com base na forma dos filmes soviéticos de autores como Eisenstein
e Pudovkin.
O trecho a seguir é do site
http://www.mariopeixoto.com/limite.htm:
“As cenas do barco em Limite podem evocar paralelos com Aurora (1927), o primeiro filme americano de
Murnau, e também as cenas de gritos revelam algumas similaridades. Os campos e
plantas em movimento podem evocar reminiscências a Terra (1930), de Alexander Dovzhenko, e,
obviamente, pode-se mencionar uma enorme variação de movimentos e ângulos da câmera
como uma exploração do próprio medium filme.”
No filme quase não há uma trama. São duas mulheres e um
homem em um barco à deriva, no oceano.
Isso, digamos, é a parte “material” do filme. Na verdade o que interessa é o
estado de espírito desses personagens. Logo se vê a mulher acorrentada. Ela
exibe os pulsos amarrados para a câmera. E há uma profusão de closes, com
expressões de angústia que se pode querer ver como a situação de naufrágio. No
caso é, sim, um naufrágio, mas anímico. O titulo não é à toa: chega-se ao
limite de cada personagem, o que eles sentem e querem se libertar.
Orson Welles elogiou o filme. Quando o Cine Clube APCC o
exibiu no Grêmio Português, nos anos 1970, foi como um enigma para a plateia.
Esperava-se um filme mudo na linha tradicional, com uma história a contar e
muitos intertitulos explicando o que se passa. Isso não acontece com “Limite”.
Quase não há letreiros entre cenas. Surge na brilhante fotografia de Edgar
Brasil o esforço de atores como Olga Breno, Tatiana Rey e Raul Shonoor.Suas
personagens não tem nomes: apenas Mulher 1, Mulher 2, Homem 1. E a montagem
desafia a época na assincronia de sequencias. Longe de Peixoto a linguagem
linear, mesmo se pensasse em expor um sonho. O que ele pretendeu foi que a
imagem faça sugerir conflitos interiores, um desafio para o cinema que nesse
ponto perdia para a literatura onde o leitor empresta as suas emoções ao texto.
Mério Peixoto, à direita, e amigo.
Mario Peixoto ficou com a imagem de
excêntrico. Vivia só em uma ilha e quem nos contou alguma coisa sobre ele foi
Waldemar Henrique a quem ele havia convocado para elaborar a musica de seu
próximo projeto cinematográfico. Waldemar chegou a passar dias na casa de
Peixoto compondo de acordo com o argumento apresentado. Mas o diretor não
conseguiu financiamento e o filme não foi realizado. Peixoto faleceu aos 82
anos, em 1992. Foi alvo do documentário “Onde a Terra Acaba” (2002), de Sergio
Machado e mencionado em “Cinema Falado” (1986) de Cateano Veloso.
Em 2007, a mostra HIGH LINE FESTIVAL exibiu a versão
restaurada de “Limite”, no Festival de Cannes, momento em que também foram
exibidos vários filmes selecionados para a World Cinema Foundation, criada por
Martin Scorsese, cujo o objetvo é a preservação, restauração e exibição de
produções históricas, sobretudo da África, América Latina, Ásia e Europa
Central.
O programa “Cinema e Musica” apresentado mensalmente no
Olympia anuncia para novembro o clássico “Nosferatu” de Murnau e para dezembro
alguma surpresa. É uma iniciativa da Funbel, ACCPA e Fundação Carlos Gomes na
presença de Paulo José Campos de Melo.
Luzia, muito bom a escolha de Limite, assim mostra a todos nós os primordios da produção cinematografica brasileira, seria bom claro se possivel alguma produção de outro pioneiro o Humberto Mauro
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