Desconheço a real motivação de
Roberto Rodriguez (“O Mariachi”, “Machete”) filmando a “graphic novel” de Frank
Miller exibir por quase duas horas sequencias graficamente trabalhadas de sexo,
violência (tudo explicito), detalhes de assassinatos, personagens tresloucados,
um mundo sombrio onde só o bizarro é eleito. Desde o início sua opção foi
seguir essa linha.
“Sin City 2, A Mulher Fatal” (Sin
City, A Dame to Kill For/EUA,2014), para alguns críticos, traduz o que hoje
está sendo estudado como filme neo-noir que segundo o autor e fotógrafo
aclamado internacionalmente Robert Arnett “ é um estilo que se “tornou tão
amorfo como um gênero / movimento, qualquer filme com um detetive ou um crime
qualificado”. "Sin City..." é construído em capítulos intercalando-se
diferentes histórias e seus personagens, com os atores que os representam:
“Just Another Saturday Night” tem Mickey Rourke (Marv) vagando à
noite pela cidade. Em “The Long Bad Night” é Joseph Gordon-Levitt
(Johnny), mais Powers Boothe (Senator Roark), Julia Garner (Marcy), Christopher
Lloyd (Kroenig), Jude Cicolella (Lieutenant Liebowitz) e Lady Gaga (Bertha) atormentados
por uma vingança. “A Dame to Kill For” mostra Josh Brolin (Dwight McCarthy),
Eva Green (Ava Lord), Dennis Haysbert (Manute), Christopher Meloni (Mort),
Rosario Dawson (Gail), Ray Liotta (Joey), Juno Temple (Sally), Jeremy Piven
(Bob), Stacey Keach (Wallenquist), Jaime King (Goldie), Marton Csokas (Damien
Lord)e Jamie Chung (Miho) entre ciclos de matança. E em “Nancy’s Last
Dance” é Jessica Alba (Nancy Callahan) e Bruce Willis (John Hartigan) entre
amor e ódio com direito a facadas.
O filme segue duas das primeiras
histórias do “Sin City” de 2005, da mesma dupla (o diretor de cinema e o
desenhista) - “A Dama Fatal” e Just Another Saturday Night”, e mais dois contos
originais criados para o novo filme. A meta era transpor a estética dos
quadrinhos ao gênero “neo noir”, aumentando o que se sugeria em termos de
violência e aproveitando a atual liberdade de expressão para mostrar as
personagens desnudas ou imitando o ato sexual.
O interesse do filme é captar a
plasticidade dos quadrinhos originais. Filmado em preto e branco, e agora em
3D, assume a iluminação que dosa o claro e escuro lembrando a linha
expressionista (não chega ao caligarismo, pois a alternância de tons é
gratuita, sem a pretensa fantasmagoria dos filmes alemães que inauguraram o gênero
em cinema seguindo a pintura). A primeira parte já exibe a iluminação bem
detalhada que de qualquer maneira ajuda na trama do personagem que sofreu
torturas e segue numa missão de vingança. Ruas, prédios, detalhes de lugares
dão margem ao adjetivo que designou um tipo de filme: “noir” (André Bazin
chamou assim os policiais que preferiam a ação na penumbra para reforçar o
mistério procurado pela câmera). Mas se o noir é sutil, como mostrou John
Huston no clássico “The Maltese Falcon” (no Brasil “Reliquia Macabra”), nos
dois “Sin City” é uma posição estilística, usando a opção para reforçar o
macabro. Isto já se percebe no segundo episódio da narrativa e Rodriguez
seguindo o falecido Miller mostra que a aventura policial é irmã da
fantasmagoria de um Nosferatu de Murnau. Nesse ponto há uma controvérsia: o
“filme noir” não é obrigatoriamente um filme de terror. Pergunta-se: o neo-noir
assume essa outra expressão? Murnau, ao realizar “Aurora” (Sunrise/1927) usou o
claro e escuro na forma de um romance, com até mesmo licença cômica (a
sequência da festa em que um participante passa a suspender o decote do vestido
de uma dama cuja alça no ombro teima em cair). Em “Sin City” (que quer dizer
“Cidade do Pecado”), a alternância de claro e escuro serve também para reforçar
a expressão estética de violência. As duas mulheres vingadoras lutam e matam
como seus ancestrais masculinos de tantos filmes machistas do passado. Para
reforçar a fúria sanguinária desses tipos usa-se a sombra por sobre corpos e
espaços ao redor. Na 3D fica mais evidente o aspecto plástico. E é isso que
Frank Miller quis nos desenhos. Rodriguez tentou obedecer o estilo. Quem
pergunta a motivação de tantas cenas agressivas sai do programa. Ou da plateia.
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